sábado, 20 de fevereiro de 2016

Oito odiados

Quentin Tarantino é realizador de cinema e guionista dos mais conhecidos dos Estados Unidos. Muita da sua fama provém do emprego da violência nos seus filmes, que encontramos de novo em Oito Odiados. Se nos filmes com Uma Thurman, restava a esperança de uma vingadora com alguma razão por detrás da sua força demolidora, no filme mais recente não há marcas de humanidade. Aliás, para uma história de ficção, parece-me haver uma improbabilidade: todos os odiosos morrem mais os que foram vítimas da violência, sem ficar ninguém para contar a história ao escritor e guionista.

Mas os Oito Odiados tem alguns elementos de excelente referência, tais como a longa caminhada desde o horizonte de uma carruagem (ou diligência, como li), uma espécie de fantasma a anunciar premonitoriamente a trama ficcional. A câmara está fixa a mostrar um lento movimento até perto do ângulo de visão do espectador. Dentro da carruagem, um caçador de criminosos John Ruth (Kurt Russell) transporta uma criminosa, Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh), que espera a forca em troca de uma boa quantia de recompensa para o caçador por a ter apanhado. No decurso da viagem, cai um grande nevão e, na estrada, indivíduos pedem boleia. Com modos muito rudes e autoritários, até violentos, Ruth aceita a sua entrada. Todos vão parar a uma estalagem - uma loja de retrosaria como aparece também indicada - e dos estalajadeiros não há sinal. Mas o velho negro que combateu pelo lado do Norte adivinha incongruências no registo de um possível colaborador dos donos da estalagem. E a morte por ingestão de café com veneno levanta mais suspeitas.

Após o intervalo, Tarantino mostra-nos imagens do líquido venenoso entornado para dentro da cafeteira, depois de nos indicar que a criminosa Daisy Domergue viu a ação. Aqui, há outro elemento de referência do filme - a ideia de guião não-linear, voltando a ação para trás e mostrando os hóspedes mais antigos, que assassinariam os donos da estalagem e os seus empregados. O objetivo era esperar a chegada da criminosa para ser libertada.

A história decorre poucos anos depois da Guerra Civil Americana (1861-1865) e o realizador levanta velhos traumas, como a luta entre Norte e Sul. Os de um lado e do outro aparecem representados no filme e mais um negro (que acusa o do sul de ser esclavagista). Para completar falta apenas uma personagem índia. No filme, há uma permanente representação de cumplicidades e de traições, ninguém escapa a esse destino fatal. Calculo que tenha havido muita discussão nos Estados Unidos por causa do recordar esses tempos e sem uma grelha crítica de apoio ao espectador. E, fora dos Estados Unidos, o filme também magoa, porque ele apenas uma sociedade desigual, violenta e sangrenta, afinal a imagem que temos do yankee que se tornou o polícia do mundo.

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