sexta-feira, 27 de novembro de 2009

ECONOMIA DOS MEDIA


Quando comecei a ler World of media. Yearbook of Russian Media and Journalism Studies 2009, pensei que se tratava de uma obra inspirada na corrente da economia política, devedora da perspectiva marxista, como em Vincent Mosco, Janet Wasko, Graham Murdock e Helena Sousa. Mas reparei melhor na biografia dos autores.

Elena Vartanova, directora da Faculdade de Jornalismo da universidade Lomonosov e a editora do livro, é doutorada em filologia. Yassen Zassoursky, a quem homenagearam em Outubro, presidente da mesma faculdade, é filólogo. A primeira desenvolve estudos nomeadamente na economia dos media, o segundo tem trabalhado a sociedade da informação e dos media, mas a sua especialização é literatura americana e estudos comparativos das literaturas americana e russa. Dos diversos colaboradores do livro, e docentes da mesma faculdade, contei uma mão cheia de mais filólogos.

O olhar do filólogo, atento aos sinais, ao uso das palavras em situações concretas, é o ideal para analisar uma sociedade que sofreu uma das mais profundas alterações políticas e sociais na passagem do século XX para o XXI, a Rússia. Por isso, estudar as tendências de mudança dos media deve passar pela leitura destes observadores atentos e privilegiados.

Diz Vartanova no seu texto (p. 21): a discussão dos temas de censura, liberdade de expressão e relação media e política deu lugar ao debate sobre o afastamento da política por parte dos indivíduos e das audiências de massa. Hoje, as pessoas estão mais voltadas para a sua carreira, salários, vida familiar e sucesso pessoal, distanciando-se da esfera pública para se preocuparem com a esfera individual. Consumem conteúdos mediáticos leves (filmes, séries, programas humorísticos, concursos, reality-shows, revistas sobre celebridades) em detrimento da informação de qualidade (notícias, análise, documentário) (p. 31). Esta última é apenas utilizada pela elite. O consumo dos media processa-se essencialmente como actividade de lazer (e prazer, acrescento). O tempo livre é alvo de produtores de conteúdos, anunciantes e fabricantes dos media. Ela conclui (p. 39) que, das funções dos media - informação, educação, interactividade, entretenimento -, é esta última a mais procurada pelos produtores dos media.

Num texto mais curto, e simultaneamente mais complexo e esquemático (a precisar de aprofundamento e evidência empírica), o filólogo Yassen N. Zassoursky destaca os diferentes modos de consumo dos media e as suas audiências (pp. 41-43). Se a audiência era individual nos séculos XVII-XIX (ler jornais e revistas no café, ao pequeno almoço, no escritório), torna-se simultaneamente individual e colectiva na primeira metade do século XX (leitura do jornal, ida ao cinema) (e escuta e visão na rádio e no começo da televisão, acrescento eu) e de massa ou consumo de massa (gosto já não individual mas colectivo, consumo colectivo). A economia dos media atende especialmente ao tempo livre, ideia que liga Zassoursky a Vartanova, e os media ocupam-se do desporto, da cultura de massa, do entretenimento e do turismo, com a publicidade a influenciar as opções da televisão comercial em detrimento das dimensões educacional e informacional.

O aparecimento da internet torna o consumo individual, em diversos casos. Mas, em situações de crise (acontecimentos trágicos, inesperados, de dimensão nacional ou mundial), as audiências regressam aos media de massa que controlam o espaço informativo. Ao mesmo tempo, o telefone móvel (acesso a conteúdos e transmissão de conteúdos) e a desmonopolização da televisão global (a concorrência da Al Jazeera frente à CNN, por exemplo) significam mais complexidade e turbulência. Mas o velho sábio Zassoursky já não trabalha este futuro.



[imagem tirada em 8 de Outubro último, na universidade Lomonosov; Elena Vartanova está de pé, a falar ao microfone, e Yassen N. Zassoursky senta-se ao seu lado esquerdo]

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