quinta-feira, 30 de julho de 2009

RITUAIS, PROFISSIONALISMO E AUSTERIDADE

Em Portugal, parece-me, uma prova de doutoramento ainda ressoa a pompa e regras de pequena elite confortada por títulos académicos. As longas becas pretas recordam a ordem do reconhecimento por um curto número de pares. A dialéctica ao longo da prova, gongórica e com floreados, soa a velha retórica ou a medievalismo. Além disso, o processo é longo, de duas a três horas. A que são convidados a asssistir familiares, amigos, colegas. Lembro-me da sala dos Capelos (Sala Grande dos Actos) em Coimbra, onde fui uma vez como membro do júri: o candidato fica a uma grande distância dos membros do júri - em número de sete ou nove elementos - e a um grande desnível, o que pode intimidar. Ao candidato é dada a possibilidade de apresentar uma síntese do trabalho, findo a qual os elementos do júri podem argumentar (arguir). O orientador junta-se ao júri e pode e/ou deve influenciar os restantes membros do júri a atribuir determinada classificação.

Já em Espanha, o vestuário específico dos membros do júri é um simples fato habitual de saída, com gravata. Do júri (cinco ou sete elementos) não faz parte o orientador. A sala está também aberta à presença do público, que assiste à apresentação prévia de síntese do trabalho pelo aluno e depois à réplica pelo júri, modelo próximo do português. O tempo de duração da prova é semelhante ao de Portugal. A cerimónia leva à festa: o candidato convida o júri para almoçar (o comer). Tive uma única mas inolvidável experiência na Complutense (Madrid).

Uma arguência muito recente no Reino Unido (Lincoln), deu-me outra visão: o júri tem apenas três membros (a presença de um quarto elemento é uma espécie de garantia de que tudo corre bem, sem qualquer intervenção nas provas e retirando-se antes da decisão da aprovação). Antes da prova, o júri reune, debate as questões mais salientes do trabalho a examinar ao vivo (diz-se viva) - as forças e as fraquezas do texto em discussão - e distribui as perguntas entre si, numa divisão clara de tarefas. Não é uma prova pública, pois apenas estão o candidato e o júri, com aquele a fazer um exame perante este, com uma duração entre uma e duas horas. Ao orientador é dada a permissão de estar presente na sala mas sem qualquer envolvência. O júri veste ainda mais informalmente que em Espanha. A prova começa exactamente com perguntas e não é dada a possibilidade ao candidato de fugir a uma pergunta (em Portugal, o arguente levanta um conjunto de perguntas e, por vezes, até indica que o aluno pode não responder a uma ou outra). No Reino Unido, o aluno sai com a recomendação de fazer emendas (em maior ou menor quantidade), de modo a melhorar o trabalho - o minor amendment. A crítica construtiva visa tornar o trabalho mais apto para a leitura pela comunidade científica [as imagens a seguir foram tiradas em Lincoln].

3 comentários:

Unknown disse...

Muito interessante ;) Nós somos ainda muito formais em muitas coisas...

Nessy disse...

Boa tarde Professor,

Achei muito interessante que tenha trazido esta temática para o blogue. Sempre tive imensa curiosidade em saber como se processava a defesa de uma tese, e hoje, ao ler o seu post, fiquei esclarecida e ainda tive direito a exemplos comparativos.

Gostei do modelo inglês!!

Saudações académicas e boas férias.

hidden persuader disse...

Um fait-diver/curiosidade: a minha mulher é de Lincoln e todos os Verões costumo lá dar 1 saltito. Tal como disse no início ... um fait-diver :)