sexta-feira, 3 de dezembro de 2004

FILME A COSTA DOS MURMÚRIOS

costamurmurios.JPGDe Beatriz Batarda vira os filmes Quaresma (2003, de José Álvaro Morais) e Noite escura (2004, de João Canijo), colocando um post sobre este último no passado dia 8 de Novembro. Agora foi a a vez de A Costa dos Murmúrios (2004), filme de Margarida Cardoso baseado num romance de Lídia Jorge.

Retiro do sítio Cinecartaz.Público.pt, o seguinte texto: "No final dos anos 60, Evita (Beatriz Batarda) chega a Moçambique para casar com Luís, um estudante de matemática que ali cumpre o serviço militar. Evita rapidamente se apercebe que Luís já não é o mesmo e que, perturbado pela guerra, se transformou num triste imitador do seu capitão, Forza Leal. Quando os homens partem para uma grande operação militar no Norte, Evita fica sozinha e, no desespero de tentar compreender o que modificou Luís, procura a companhia de Helena, a mulher de Forza Leal. Submissa e humilhada, Helena é prisioneira na sua casa, onde cumpre uma promessa".

Através de Helena, Evita conhece o lado escondido de Luís. E, apesar de oposicionista (prática que trouxera de "um café estúpido do Campo Grande", diz Luís), ela deixa-se enredar no "sistema" (a África não é preta, é amarela, comenta-se no filme). Repete quase a história de Helena, só que com desfecho diferente. Dois militares, duas ociosas mulheres de oficiais num regime moribundo, em África.

Interpretar os factos, escrever a História

Gostei de ver Beatriz Batarda no filme de Canijo (mulher vigorosa num ambiente social e profissional sórdido) e no filme de Morais (mulher com problemas de ordem psíquica, pertencente à classe média alta), duas interpretações que me levam a vê-la como uma das actrizes mais completas do actual cinema português. Mas aqui não. Para mim, há má condução de actores e actrizes. Beatriz Batarda parece que soletra as palavras, como se aprendesse a língua ou corrigisse a pronúncia. E a história até é interessante, o elenco bom, mas com um ritmo lento.

O filme coloca uma questão, à qual eu sou sensível, a guerra colonial, a meu ver bastante mais próximo da realidade do que Os imortais de António Pedro Vasconcelos (que analisa os traumatismos pós-guerra). Em A costa dos murmúrios, vêem-se as crises psicológicas que resultam do conflito entre sonho e áspera situação social, que relacionam a condição do indivíduo com uma situação colectiva em decomposição.

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Enquanto assistia ao filme pensei nessa guerra colonial simultaneamente já longínqua (passaram quase trinta anos desde o seu fim) e perto de nós (porque parecemos estar ainda de luto e não ter energias para discutir a guerra, o fim do império, o regresso a casa).angola3.JPG

Curiosamente, eu que julgava que tinha enterrada a minha experiência pessoal nessa guerra, porque o passado apenas me interessa enquanto historiador e não em termos de envolvimento próprio, voltei a recordar algumas cenas [imagens do meu arquivo pessoal].

Na realidade, foi uma guerra prolongada e sem sucesso (1961-1974), momento doloroso e com feridas ainda abertas. Mas a História precisa de ser escrita e a ficção que vi não ajuda minimamente a perceber esse período.

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