quinta-feira, 22 de abril de 2004

PEDRO SENA NUNES NO TEATRO CINE DA COVILHÃ

Ao mesmo tempo que arrancava o congresso das ciências da comunicação, organizado pela SOPCOM (Associação Portuguesa das Ciências da Comunicação), o Teatro Cine da Covilhã passava duas curtas-metragens de Pedro Sena Nunes.

Cidade com 40 mil habitantes e cinco mil estudantes universitários, a Covilhã tem um Teatro Cine que foi inaugurado em 31 de Maio de 1954, pela companhia de teatro Amélia Rey Colaço-Robles Monteiro, segundo uma placa ali colocada. E, em 1957, cantava-se La Traviata, dirigida pelo maestro Frederico de Freitas, conforme outra placa comemorativa. Teatro e ópera num tempo em que a televisão ainda não existia sequer em Lisboa. O Teatro Cine tem uma fachada granítica imponente, numa esquina de ruas do centro da cidade. Pelo ar interior sofreu obras recentes; está impecável, em linguagem simples.

Fui assim movido pela curiosidade ver as duas curtas-metragens de Pedro Sena Nunes. A primeira intitulava-se A morte do cinema e narrava a história de Álvaro Dias, mecânico de automóveis e projeccionista do cinema Avenida, em Aveiro, que recuperara uma máquina de projectar do cinema da Murtosa e passava sessões clandestinas para amigos e curiosos. Especialmente, filmes apimentados (como os de Cicciolina) e para senhoras (como o filme Música no coração). Frequentemente narrado em voz directa pelo antigo mecânico e projeccionista, a curta-metragem fez-me lembrar o filme Cinema Paraíso. Os projeccionistas são homens (ou mulheres) como nós, tem uma ânsia de passar a cultura cinematográfica. Se o personagem de Cinema Paraiso tinha uma memória cinematográfica quase erudita, o personagem real do filme de Sena Nunes está mais próximo da terra e da ria de Aveiro, uma das cidades com que mais me identifico e onde trabalhei gostosamente durante o primeiro semestre de 2000.

A segunda curta-metragem de Pedro Sena Nunes que passou no Teatro Cine da Covilhã intitula-se Cacilheiros - Alerta. Enquanto a primeira película era uma história de vida, muito etnográfica, esta conta a história de um homem e uma mulher que atravessam sem se cruzarem nunca o Tejo, em cacilheiros ou em barcos de alerta e vigilância. Há sonhos que se expressam no rosto do homem e há fantasias na mulher bailarina. Quase não há uma estória mas há um ritmo narrativo que agrada. E quase me chegava ao nariz o cheiro da água do rio Tejo, entre o fétido e o proveniente de algas. A música de Carlos Zíngaro, sincopada, minimalista, ajudava as deambulações e as fantasias dos dois personagens.

Pena que a magnífica sala - que eu pressentia plena de casais a chorarem com as árias da Traviata e a aplaudirem Amélia Rey Colaço e a companhia, há quase cinquenta anos, talvez juntando ainda todos os estudantes universitários para um espectáculo da tuna - tivesse quatro espectadores. Há umas semanas fui ver Goodbye Lenin, no Mundial, onde também estavam quatro espectadores. O cinema fecharia uns dias depois...

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